Uma velha e perfeita cozinheira a quem pedi a fórmula sagradaDa feijoada à mineira,Mandou-ma. Ei-la: 'Receita de Feijoada -Tome coisa de um litro de feijãoPreto, novo, sem bicho,E, depois de catado com capricho,Jogue no caldeirão.(Com feijão que não seja preto é à toatentar fazer feijoada.E se tentar, não cuide que sai boa;Sai não valendo nada.)Quando estiver o caldeirão fervendoOu antes, deite o sal,As mãos de porco, orelhas e, querendo,Focinhos e rabo; isto (está claro) tendo,Porque não tendo é o mesmo, não faz mal.Se, além desses preparos, deitar nelaLinguiça e mais um osso de presunto,Só o cheiro da panelaFaz crescer água à boca de um defunto.Eu já me ia esquecendo (que memória)Da carne seca e da couve.Feijoadas sem elas, qual! É a história...Não há nem nunca houve.Depois de tudo bem cozido, a ponto,Machuque bem um pouco de feijãoE pronto.Mas machuque só a parte que senãoEm vez de feijoada sai pirão.Eis, aí está o prato preparado...Minto: falta ainda o molhoQue embora simples é o segredo e escolhoDe muito bom guisadoO molho faz-se com vinagre, ou então,(Para sair a coisa mais completa)com suco de limãoe bastante pimenta malagueta.Sal, ponha quantum satisNão vai ao fogo nem ligeiramenteExceto se levar também tomates,Cebola, ou outro que tal ingredienteCom a feijoada, a clássica, a mineiraÉ compulsório o uso de farinha.Como bebida, um trago de caninha.Há quem regue a vinho; mas é asneira.Quanto à caninha fale-seOu não se fale, a mim é indiferente.Eu tenho a firme opinião que um cáliceNenhum mal faz à gente.'Eis aí a receita.Publico-a sem responsabilidade.Experimentem, se sair bem feitaE eu, no dia, estiver nessa cidade...Não insinuo nada: Apenas lembro que ninguém rejeitaConvite para almoço de feijoada.Carlos Drummond de AndradeEspertalhotes: joana, filipa & miguel, neptumância, papalaguiEtiquetas: andrade tropical