sexta-feira, julho 11, 2008

11 de Julho - Citação do Dia

Poemarma

Que o poema tenha rodas motores alavancas
Que seja máquina espectáculo cinema
Que diga à estátua: sai do caminho que atravancas
Que seja um autocarro em forma de poema

Que o poema cante no cimo das chaminés
Que se levante e faça o pino em cada praça
Que diga quem eu sou e quem tu és
Que não seja só mais um que passa

Que o poema esprema e gema do seu tema
e seja apenas um teorema com dois braços
Que o poema invente um novo estratagema
para escapar a quem lhe segue os passos

Que o poema corra salte pule
Que seja a pulga e faça cócegas ao burguês
Que o poema se vista subversivo de ganga azul
e vá explicar numa parede alguns porquês

Que o poema se meta nos anúncios das cidades
Que seja sinalização radar
Que o poema cante em todas as idades
(que lindo!) no presente e no futuro o verbo amar

Que o poema seja microfone e fale
uma noite destas de repente às três e tal
para que a lua estoire e o sono estale
e a gente acorde de novo em Portugal

Que o poema seja encontro onde era despedida
Que participe. Comunique. E destrua
para sempre a distância entre a arte e a vida
Que salte do papel da página para a rua

Que seja experimentado mais do que experimental
Que tenha ideias sim mas também pernas
e até se partir uma não faz mal
antes de muletas que de asas eternas

Que o poema assalte esta desordem ordenada
Que chegue ao banco e grite: abaixo a pança!
Que faça ginástica militar aplicada
e não vá como todos vão para França

Que o poema fique. E que ficando se aplique
a não criar barriga a não usar chinelos
Que o poema seja um novo Infante D. Henrique
voltado para dentro. E sem castelos

Que o poema vista de domingo cada dia
e atire foguetes para dentro do quotidiano
Que o poema vista a prosa da poesia
ao menos uma vez em cada ano

Que o poema faça um poeta de cada
funcionário já farto de funcionar
Ah que de novo acorde na lusíada
a saudade de novo o desejo de achar

Que o poema diga o que é preciso
Que chegue disfarçado ao pé de ti
e aponte a terra que tu pisas e eu piso
e que o poema diga: 'o longe é aqui'

Manuel Alegre

Ilustre Blog Convidado da Semana

Suplemento de Serviço Cívico:
Se Tu Lês, Eles Lêem

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1 Comments:

Blogger eduardo jai said...

manuel alegre escreve, quase sempre, com a alma de uma ceifeira que acabou de se depilar e vai de seguida comprar, no mini-mercado, "minis", para que o latifundiário da cortiça, seu esposo, fique em casa nessa noite, a cofiar o... bigode.

manuel alegre, quase sempre, escreve como um sócrates que já não se lembra bem da célebre frase proferida e que, pelo sim pelo não, a bem da nação, em caso de dúvida, afirma: "conhece-te a mim mesmo."

não!
não, não...
vou parar...

não vim para falar do manuel (phew, safei-me) mas para agradecer a ilustre nomeação semanal.

curta de tempo mas, enfim, os óscares quando nascem não são anuais para todos. e quem dá, a mais não é obrigado. já dizia o ramires, antes de se perder a caminho de casa...

um abraço, Amiga, deste teu ilustrado e reconhecido leitor.

e um dia BOM!
:)

4:54 da tarde  

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