sexta-feira, dezembro 30, 2005

30 de Dezembro - Último Post do Ano

A jerenssia dest belogue deseija a toudos os quelientes e hamigues um Felis Anouvo com muntas propiedades.


RECEITA DE ANO NOVO

Para você ganhar belíssimo Ano Novo
cor do arco-íris, ou da cor da sua paz,
Ano Novo sem comparação com todo o tempo já vivido
(mal vivido talvez ou sem sentido)
para você ganhar um ano
não apenas pintado de novo, remendado às carreiras,
mas novo nas sementinhas do vir-a-ser;
novo
até no coração das coisas menos percebidas
(a começar pelo seu interior)
novo, espontâneo, que de tão perfeito nem se nota,
mas com ele se come, se passeia,
se ama, se compreende, se trabalha,
você não precisa beber champanha ou qualquer outra birita,
não precisa expedir nem receber mensagens
(planta recebe mensagens?
passa telegramas?)
Não precisa
fazer lista de boas intenções
para arquivá-las na gaveta.
Não precisa chorar arrependido
pelas besteiras consumidas
nem parvamente acreditar
que por decreto de esperança
a partir de janeiro as coisas mudem
e seja tudo claridade, recompensa,
justiça entre os homens e as nações,
liberdade com cheiro e gosto de pão matinal,
direitos respeitados, começando
pelo direito augusto de viver.
Para ganhar um Ano Novo
que mereça este nome,
você, meu caro, tem de merecê-lo,
tem de fazê-lo novo, eu sei que não é fácil,
mas tente, experimente, consciente.
É dentro de você que o Ano Novo
cochila e espera desde sempre.


Carlos Drummond de Andrade

Com um obrigada à Andante http://www.andante.com.pt/

O resultado sai no ano que vem...

Espertalhotas: fungaga, papalagui, joana e caracois

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quinta-feira, dezembro 29, 2005

29 de Dezembro - Citação do Dia

O menino desenha
O pólen do seu lápis cai nas folhas maltratadas;
No papel, a mãezinha é apenas uma bolha.
O menino risca e pede a Deus que o seu pai venha
Ver estas coisas desenhadas.

A irmãzinha mais moça quer o lápis e olha,
Uma lágrima em bico o seu olhar envidraça;
A chuva do menino são uns pontos tão depressa
Que o lápis se estilhaça.

O menino faz o galo, a torre, a casa e o judeu,
Que mostra aos outros meninos:
Mas a casa é que tem as pernas e o galo é que abre janelas,
A torre é que usa as barbas e o judeu tem os sinos
Por não ter nada de seu.
Oh meu rico menino, que fazes as coisas belas!

A irmã mais velha do menino há-de
Ser a mãe dos sobrinhos que desenharão também
O tio com uma bolha, como ele vê em bolha a sua mãe.
'Tem óculos, não está quieta e é muito boa';
O menino garatuja,
E vê-se a luz e os vidros, e até se vê a bondade
Que veio à sua mão suja
Do lado em que estava a pessoa.

O irmãozito do menino
Também está metido, e bem, neste quadrado:
É aquela figura de que o avô disse: 'É um pepino!',
Sem se lembrar que o artista podia ficar magoado.

Vitorino Nemésio


Espertalhota do Dia: caracois

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quarta-feira, dezembro 28, 2005

Grande Concurso As Palavras dos Outros

OK, vamos lá dar uma pitada de entretenimento a este blog tão maçudo. A partir de hoje deixo de pôr os autores das citações. Os caros visitantes do blog são convidados a dar o seu palpite quanto à autoria do naco de poesia ou prosa aqui postado. A partir da meia-noite, a citação será editada para acrescentar o nome do autor.

O vencedor não ganha absolutamente nada, a não ser a admiração e a inveja dos outros concorrentes e da administradora do blog. No final de cada mês, anunciarei o nome do 'Espertalhote do Mês', aquele que teve mais respostas certas. Serei boazinha e não instituirei o prémio 'Barraca do Mês', para quem tiver o maior número de respostas ao lado. O primeiro Espertalhote será anunciado no final de Janeiro.

LET THE GAMES BEGIN!

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28 de Dezembro - Citação do Dia

Julgar que uma criatura participa de uma existência desconhecida em que o seu amor nos faria penetrar é, de tudo o que exige o amor para nascer, aquilo a que ele mais se prende e que o faz desdenhar do resto. Até as mulheres que pretendem só avaliar um homem pelo físico, vêem nesse físico a emanação de uma vida especial. Eis porque elas amam os militares, os bombeiros; o uniforme torna-as menos exigentes para o resto; julgam que beijam, atrás da couraça, um coração diferente, aventureiro e terno; e um jovem soberano, um príncipe herdeiro, para fazer as mais lisongeiras conquistas nos países que visita, não tem necessidade de um perfil regular, que talvez fosse indispensável a um corretor da Bolsa.

Marcel Proust, Em Busca do Tempo Perdido

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terça-feira, dezembro 27, 2005

27 de Dezembro - Citação do Dia

We pass and dream. Earth smiles. Virtue is rare.
Age, duty, gods weigh on our conscious bliss.
Hope for the best and for the worst prepare.
The sum of purposed wisdom speaks in this.

Fernando Pessoa

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segunda-feira, dezembro 26, 2005

26 de Dezembro - Citação do Dia

Embora toda e qualquer guerra represente o malogro do homem como ser pensante, havia, no entanto, nessas guerras que já lá vão, uma boa dose de cavalheirismo, de bravura e de bondade. Matavam-se e mutilavam-se homens, é certo, mas não lhes adulteravam a semente, de maneira a comprometer a integridade de gerações futuras.
Temos sido, durante muitos anos, alimentados de medo e só de medo - e este jamais produziu bons frutos. Os seus filhos, germinando no seio das trevas, são a crueldade, a traição e a desconfiança. E, tal como envenenamos a atmosfera com bombas experimentais, assim envenenamos as nossas almas com o medo - um medo sem rosto, um medo insensato e corrosivo.

John Steinbeck, Correspondente de Guerra

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domingo, dezembro 25, 2005

25 de Dezembro - Citação do Dia

Dia de Natal

Hoje é dia de ser bom.
É dia de passar a mão pelo rosto das crianças,
de falar e de ouvir com mavioso tom,
de abraçar toda a gente e de oferecer lembranças.

É dia de pensar nos outros - coitadinhos - nos que padecem,
de lhes darmos coragem para poderem continuar a aceitar a sua miséria,
de perdoar aos nossos inimigos, mesmo aos que não merecem,
de meditar sobre a nossa existência, tão efémera e tão séria.

Comove tanta fraternidade universal.
É só abrir o rádio e logo um coro de anjos,
como se de anjos fosse,
numa toada doce,
de violas e banjos,
Entoa gravemente um hino ao Criador.
E mal se extinguem os clamores plangentes,
a voz do locutor
anuncia o melhor dos detergentes.

De novo a melopeia inunda a Terra e o Céu
e as vozes crescem num fervor patético.
(Vossa Excelência verificou a hora exacta em que o Menino Jesus nasceu?
Não seja estúpido! Compre imediatamente um relógio de pulso antimagnético.)

Torna-se difícil caminhar nas preciosas ruas.
Toda a gente se acotovela, se multiplica em gestos, esfuziante.
Todos participam nas alegrias dos outros como se fossem suas
e fazem adeuses enluvados aos bons amigos que passam mais distante.

Nas lojas, na luxúria das montras e dos escaparates,
com subtis requintes de bom gosto e de engenhosa dinâmica,
cintilam, sob o intenso fluxo de milhares de quilovates,
as belas coisas inúteis de plástico, de metal, de vidro e de cerâmica.

Os olhos acorrem, num alvoroço liquefeito,
ao chamamento voluptuoso dos brilhos e das cores.
É como se tudo aquilo nos dissesse directamente respeito,
como se o Céu olhasse para nós e nos cobrisse de bênçãos e favores.

A Oratória de Bach embruxa a atmosfera do arruamento.
Adivinha-se uma roupagem diáfana a desembrulhar-se no ar.
E a gente, mesmo sem querer, entra no estabelecimento
e compra - louvado seja o Senhor! - o que nunca tinha pensado comprar.

Mas a maior felicidade é a da gente pequena.
Naquela véspera santa
a sua comoção é tanta, tanta, tanta,
que nem dorme serena.

Cada menino
abre um olhinho
na noite incerta
para ver se a aurora
já está desperta.
De manhãzinha,
salta da cama,
corre à cozinha
mesmo em pijama. Ah!!!!!!!!!!
Na branda macieza
da matutina luz
aguarda-o a surpresa
do Menino Jesus.

Jesus
o doce Jesus,
o mesmo que nasceu na manjedoura,
veio pôr no sapatinho
do Pedrinho
uma metralhadora.

Que alegria
reinou naquela casa em todo o santo dia!
O Pedrinho, estrategicamente escondido atrás das portas,
fuzilava tudo com devastadoras rajadas
e obrigava as criadas
a caírem no chão como se fossem mortas:
Tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá.

Já está!
E fazia-as erguer para de novo matá-las.
E até mesmo a mamã e o sisudo papá
fingiam
que caíam
crivados de balas.

Dia de Confraternização Universal,

Dia de Amor, de Paz, de Felicidade,
de Sonhos e Venturas.

É dia de Natal.

Paz na Terra aos Homens de Boa Vontade.
Glória a Deus nas Alturas.


António Gedeão

Com um obrigada à Andante http://www.andante.com.pt/

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sábado, dezembro 24, 2005

24 de Dezembro - Citação do Dia

Detesto as coisas que ficam em meio, as indecisões, as estúpidas situações falsas, os sentimentos inventados, os amores de encomenda e os ódios ornamentados à mão. Quero tudo claro e definido, ou pelo menos ser capaz de distinguir as coisas pouco claras e confusas. Tudo o mais é repulsivo, e aí está porque a minha vida é repulsiva e me envergonho dela.

Katherine Anne Porter, A Nave dos Loucos

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sexta-feira, dezembro 23, 2005

23 de Dezembro - Citação do Dia

Uma deslocação rápida no espaço estimula sempre; o mesmo acontece com a notoriedade; o mesmo se verifica com a posse de dinheiro.

James Joyce, Gente de Dublin

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quinta-feira, dezembro 22, 2005

22 de Dezembro - Citação do Dia

Viver! Beber o vento e o sol! Erguer
Ao céu os corações a palpitar!
Deus fez os nossos braços pra prender,
E a boca fez-se sangue para beijar!

A chama, sempre rubra, ao alto a arder!
Asas sempre perdidas a pairar!
Mais alto até as estrelas desprender!
A glória! A fama! Orgulho de criar!

Da vida tenho o mel e tenho os travos
No lago dos meus olhos de violetas,
Nos meus beijos estáticos, pagãos!

Trago na boca o coração dos cravos!
Boémios, vagabundos, e poetas,
Como eu sou vossa Irmã, ó meus irmãos!

Vocês Sabem Quem

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quarta-feira, dezembro 21, 2005

21 de Dezembro - Citação do Dia

Luto contra o sono e desejo-o com ânsia.

John Steinbeck, O Inverno do Nosso Descontentamento

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terça-feira, dezembro 20, 2005

20 de Dezembro - Citação do Dia

Ne me quitte pas
Il faut oublier
Tout peut s'oublier
Qui s'enfuit déjà
Oublier le temps
Des malentendus
Et le temps perdu
A savoir comment
Oublier ces heures
Qui tuaient parfois
A coups de pourquoi
Le coeur du bonheur
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas

Moi je t'offrirai
Des perles de pluie
Venues de pays
Où il ne pleut pas
Je creuserais la terre
Jusqu'après ma mort
Pour couvrir ton corps

D'or et de lumière
Je ferais un domaine
Où l'amour sera roi
Où l'amour sera loi
Où tu seras reine
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas

Ne me quitte pas
Je t'inventerai
Des mots insensés
Que tu comprendras
Je te parlerai
De ces amants-là
Qui ont vu deux fois
Leurs coeurs s'embraser
Je te raconterai
L'histoire de ce roi
Mort de n'avoir pas
Pu te rencontrer
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas

On a vu souvent
Rejaillir le feu
D'un ancien volcan
Qu'on croyait trop vieux
Il est paraît-il
Des terres brûlées
Donnant plus de blé
Qu'un meilleur avril
Et quand vient le soir
Pour qu'un ciel flamboie
Le rouge et le noir
Ne s'épousent-ils pas
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas

Ne me quitte pas
Je ne vais plus pleurer
Je ne vais plus parler
Je me cacherai là
À te regarder
Danser et sourire
Et à t'ecouter
Chanter et plus rire
Laisse-moi devenir
L'ombre de ton ombre
L'ombre de ta main
L'ombre de ton chien
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas
Ne me quitte pas.

Jacques Brel

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segunda-feira, dezembro 19, 2005

19 de Dezembro - Citação do Dia

Toda a escolha tem um avesso, quer dizer, uma renúncia, não existe diferença entre o acto de escolher e o acto de renunciar.

Italo Calvino, A Taberna dos Destinos Cruzados

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domingo, dezembro 18, 2005

18 de Dezembro - Citação do Dia

Pousa um momento,
Um só momento em mim,
Não só o olhar, também o pensamento.
Que a vida tenha fim
Nesse momento!

No olhar a alma também
Olhando-me, e eu a ver
Tudo quanto de ti o teu olhar tem.
A ver até esquecer
que tu és tu também.

Só tua alma sem tu
Só o teu pensamento
E eu onde, alma sem eu. Tudo o que sou
Ficou com o momento
E o momento parou.

Fernando Pessoa

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sábado, dezembro 17, 2005

17 de Dezembro - Citação do Dia

Se os sobreviventes dessem tanta atenção aos que morrem como a que lhes prestam em vida, a maior parte dos defuntos ficaria privada de mausoléus catitas. Mas a humanidade é assim: só dá valor ao que já não possui.

Erich Maria Remarque, O Obelisco Preto

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sexta-feira, dezembro 16, 2005

16 de Dezembro - Citação do Dia

Que nenhuma estrela queime o teu perfil
Que nenhum Deus se lembre do teu nome
Que nem o vento passe onde tu passes

Para ti eu criarei um dia puro
Livre como o vento e repetido
Como o florir das ondas ordenadas

Sophia de Mello Breyner Andresen

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quinta-feira, dezembro 15, 2005

15 de Dezembro - Citação do Dia

Todos os livros eram sagrados para Yuan. Avidamente lhes voltava as páginas limpas e desconhecidas, ansioso por gravar na mente cada palavra, desejoso de aprender e aprender por puro amor ao desconhecido.

Pearl Buck, Casa Dividida

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quarta-feira, dezembro 14, 2005

14 de Dezembro - Citação do Dia

Sou filha da charneca erma e selvagem.
Os giestais, por entre os rosmaninhos,
Abrindo os olhos d'oiro, plos caminhos,
Desta minh'alma ardente são a imagem.

Embalo em mim um sonho vão, miragem:
Que tu e eu, em beijos e carinhos,
Eu e a Charneca e tu e o Sol, sozinhos,
Fôssemos um pedaço de paisagem!

E à noite, à hora doce da ansiedade
Ouviria da boca do luar
O De Profundis triste da saudade...

E à tua espera, enquanto o mundo dorme,
Ficaria, olhos quietos, a cismar...
Esfinge olhando a planície enorme...

Florbela Espanca

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terça-feira, dezembro 13, 2005

13 de Dezembro - Citação do Dia

Nos últimos tempos, sinto-me mais velho do que sou. Tenho a impressão de que começa a escapar-me alguma coisa, como se eu já não segurasse com a mesma força de outrora essa coisa indeterminada...

Thomas Mann, Os Buddenbrook

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segunda-feira, dezembro 12, 2005

12 de Dezembro - Citação do Dia

Reconhecimento à Loucura

Já alguém sentiu a loucura vestir de-repente o nosso corpo?
Já.
E tomar a forma dos objectos?
Sim.
E acender relâmpagos no pensamento?
Também.
E às vezes parecer ser o fim?
Exactamente.
Como o cavalo do soneto do Ângelo de Lima?
Tal e qual.
E depois mostrar-nos o que há-de vir
muito melhor do que está?
E dar-nos a cheirar uma cor
que nos faz seguir viagem
sem paragem nem resignação
E sentirmo-nos empurrados pelos rins
na aula de descer abismos
e fazer dos abismos descidas de recreio
e covas de encher novidade?
E de uns fazer gigantes
e de outros alienados?
E fazer frente ao impossível
atrevidamente e ganhar-lhe, e ganhar-lhe
a ponto do impossível ficar possível?
E quando tudo parece perfeito
poder-se ir ainda mais além?
E isto de desencantar vidas
aos que julgam que a vida é só uma?
E isto de haver sempre ainda mais uma maneira para tudo?
Tu só loucura és capaz de transformar
o mundo tantas vezes quantas sejam as necessárias para olhos individuais
Só tu és capaz de fazer que tenham razão
tantas razões que hão-de viver juntas
Tudo, excepto tu, é rotina peganhenta.
Só tu tens asas para dar
a quem t'as vier buscar.

Almada Negreiros

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domingo, dezembro 11, 2005

11 de Dezembro - Citação do Dia

A Egolatria já é praticada inconscientemente pela maioria dos homens.

Giovanni Papini, Gog

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sábado, dezembro 10, 2005

10 de Dezembro - Citação do Dia

Por quem foi que me trocaram
Quanto estava a olhar pra ti?
Pousa a tua mão na minha
E, sem me olhares, sorri.

Sorri do teu pensamento
Porque eu só quero pensar
Que é de mim que ele está feito
E o que tens para me dar.

E depois aperta-me a mão
E vira os olhos a mim...
Por quem foi que me trocaram
Quando estás a olhar-me assim?

Fernando Pessoa

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sexta-feira, dezembro 09, 2005

9 de Dezembro - Citação do Dia

Ella pelea en mí, y vence en mí, y yo vivo e respiro con ella, y tengo vida y ser.

Miguel de Cervantes, D. Quijote

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quinta-feira, dezembro 08, 2005

8 de Dezembro - Citação do Dia

Hoje, para morrer, era preciso
que a música viesse. E nos beijasse
as pálpebras por dentro. E um sorriso
desceria da água à nossa face.

Tudo seria finalmente liso
como um rio que nunca mais passasse.
Tudo seria tudo. Sem mesmo ser preciso
um relógio qualquer que nos guardasse

o grande amor que então percorreria
o corpo. Chamar-lhe-iam gravidade,
ou peso, ou nada, ou, simplesmente, fria

inércia, fim. Mas quem respira sabe-
-lhe a fundo o nome. De raiz diria:
amor irresistível. Terra. Ou nave.

Fernando Echevarria

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quarta-feira, dezembro 07, 2005

7 de Dezembro - Citação do Dia

A glória é uma incompreensão e talvez a pior.

Jorge Luís Borges, Ficções

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terça-feira, dezembro 06, 2005

6 de Dezembro - Citação do Dia

Eu bebo a Vida, a Vida a longos tragos
Como um divino vinho de Falerno!
Poisando em ti o meu amor eterno
Como poisam as folhas sobre os lagos...

Os meus sonhos agora são mais vagos...
O teu olhar em mim, hoje, é mais terno...
E a Vida já não é o rubro inferno
Todo fantasmas tristes e pressagos!

A Vida, meu Amor, quero vivê-la!
Na mesma taça erguida em tuas mãos,
Bocas unidas hemos de bebê-la!

Que importa o mundo e as ilusões defuntas?...
Que importa o mundo e os seus orgulhos vãos?...
O mundo, Amor?... As nossas bocas juntas!...

Florbela Espanca

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segunda-feira, dezembro 05, 2005

5 de Dezembro - Citação do Dia

Só quando queremos muito a alguém é que nos apercebemos quão escandalosa é a morte de uma criatura.

Marguerite Yourcenar, A Obra ao Negro

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domingo, dezembro 04, 2005

4 de Dezembro - Citação do Dia

Soneto do Cativo

Se é sem dúvida Amor esta explosão
de tantas sensações contraditórias;
a sórdida mistura das memórias,
tão longe da verdade e da invenção;

o espelho deformante; a profusão
de frases insensatas, incensórias;
a cúmplice partilha nas histórias
do que os outros dirão ou não dirão;

se é sem dúvida Amor a cobardia
de buscar nos lençóis a mais sombria
razão de encantamento e de desprezo;

não há dúvida, Amor, que te não fujo
e que, por ti, tão cego, surdo e sujo,
tenho vivido eternamente preso!

David Mourão-Ferreira

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sábado, dezembro 03, 2005

3 de Dezembro - Citação do Dia

Mesmo que te perca de vista, na espessura do arvoredo, não preciso de te tornar a ver para te encontrar; há qualquer coisa de ti, que não sei definir, que sinto perto de mim, no ar que te rodeia, na erva onde te sentas. Quando me aproximo de ti, sinto que os meus sentidos se deleitam. Se te toco, nem que seja com a ponta de um dedo, todo o meu corpo estremece de prazer. Diz-me que encanto é o teu para assim me cativar. Será o teu espírito? Serão as tuas carícias? Mas elas ainda me beijam mais do que tu.

Bernardin de Saint-Pierre, Paulo e Virgínia

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sexta-feira, dezembro 02, 2005

2 de Dezembro - Citação do Dia

Custa tanto saber o que se sente quando reparamos em nós!... Mesmo viver sabe a custar tanto quando se dá por isso...

Fernando Pessoa, O Marinheiro

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quinta-feira, dezembro 01, 2005

1 de Dezembro - Citação do Dia

A mim já me disseram que nós devemos querer uma coisa só, porque quem tudo quer tudo perde; ora eu gosto de muitas coisas, portanto, não posso querer só uma e, por conseguinte, perco tudo com certeza! É um péssimo feitio que eu tenho, este de não me contentar com uma coisa só! Mas dou-lhes a minha palavra de honra que uma coisa só, acho muito poucochinho! Eu sou assim. Querem ver: se me perguntarem qual é a cor que eu gosto mais, eu sei qual é; mas, apesar disso fico atrapalhado, porque a minha resposta é conforme o dia e a ocasião em que é feita a pergunta. A cor que eu mais gosto, infelizmente, não é sempre a mesma. Dizem que sou inconstante, mas será por acaso minha a culpa ou das cores? Eu sou só um e elas são tantas e tão lindas todas!
De modo que quanto mais idade vou tendo, mais coisas vou vendo, há mais coisas novas de que eu gosto, e também gosto das antigas, e juro-lhes que sofro por gostar tanto de tanta coisa! Oh quanto melhor não é ter muito que fazer e grandes encargos que nos levem o tempo todo, do que ver as coisas ciumentas por causa de eu gostar de muitas mais coisas!

Almada Negreiros

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